segunda-feira, 10 de maio de 2010

Guichê diferente por um dia





No domingo das mães, resolvi me dirigir a um guichê diferente: por livre e espontânea vontade, fui à missa.

E o que isso tem a ver com “guichês”? Muito simples... Sou espírita há 22 anos. Mas fui católica por imposição desde o dia em que nasci até os 19, quando dei adeus à Bíblia por ter passado a encontrar mais sentido no Evangelho Segundo o Espiritismo. Eu não deixei de acreditar em Jesus Cristo, nem de ter fé em Deus. Apenas mudei de guichê, como certa vez disse Chico Xavier a respeito das diferentes religiões: “Os guichês são diferentes, mas o patrão é o mesmo.” Ou seja, todos que têm uma crença estão na mesma fila que conduz a Deus, mas cada um se dirige ao guichê-religião que mais se afiniza.

Aproveitando o fato de que minha mãe tinha dormido na minha casa, decidi dar a ela este presente: acompanhá-la à missa, como eu fazia quando criança. Muito embora missa para mim sempre tenha sido uma tortura... Um verdadeiro trauma: todo santo domingo, meus pais me obrigavam (sim, obrigavam!) a ir com eles a uma missa extremamente sacal, na qual um padre velho e gringo falava com uma sonífera voz coisas que eu não entendia. Eu tinha que ficar uma hora sem fazer barulho, me levantando e sentando o tempo todo, entoando frases repetitivas. Muito duro pra uma criança! O jeito foi inventar uma brincadeira: eu fixava os olhos em alguém sentado nos bancos da frente e apenas mudava o foco quando a pessoa se mexesse, partindo em seguida para outra “vítima”. Eu passava a missa toda me “distraindo” dessa maneira. Um saco...

Aos 11 anos, aflorada pelos hormônios da puberdade, saquei minha carta de alforria e, num belo domingo, fui veemente com o meu pai: “Não irei mais com vocês à missa. Só quando eu quiser.” E apenas aos 15 ou 16 anos quis voltar a uma missa, quando passei a fazer parte de um grupo jovem. Mas, cá entre nós, meu principal interesse era fazer amigos e arrumar namorado do que propriamente me aproximar de Deus!

E agora, aos 41 anos, lá estava eu na Igreja do Loreto com minha mãe. Engraçado é que, pela manhã, eu havia acordado muito angustiada. Parecia que todos os meus problemas tinham resolvido fazer uma convenção em pleno Dia das Mães, instalando-se bem nas minhas costas... Ir à missa, então, passou a ser uma vontade real, e não apenas para agradar minha mãe. Logo na porta da igreja, disse pra ela: “Olha, vim decidida a soltar meus bichos. Tô me sentindo carregada e é aqui mesmo que vou melhorar.”

Não deu outra... Senti emoções fortíssimas no grande galpão anexo à igreja – ela havia ficado pequena para tantos fiéis –, onde muita, muita gente estava lá porque queria. Logo me surpreendi ao ver que o chatíssimo órgão de outrora havia sido substituído por uma banda! Maior surpresa ainda tive quando, no início da missa, o padre e seus ajudantes entraram igreja adentro sob o canto animado entoado por vozes em uníssono e muitas palmas. A música dizia: “Deixa a luz do céu entrar, deixa a luz do céu entraaaaaar...” E eu cantando junto, batendo palmas amarradona e dançando quase num tímido rebolation! Sim, a luz estava ali. Senti isso.

Durante vários momentos percebi ondas de energia percorrendo meu corpo, entrei em meditação profunda e, acredite, não bocejei repetidas vezes durante a homilia como sempre fazia. E na hora de comungar? Iria ou não? No início da missa, disse a mim mesma que não iria. Minha mãe já tinha me avisado: “Só pode comungar quem se confessa uma vez por ano e quem vem sempre à missa.” Fiquei com essa sentença ao purgatório martelando na minha cabeça. Mas eu estava totalmente integrada àquele momento. Se eu não comungasse, seria como ir a uma festa e não comer o bolo. Seria como ir a um centro espírita e não tomar o passe.

Sem pensar duas vezes, me lancei avidamente à fila da comunhão logo que ela começou a se formar. Mesmo que estivesse cometendo uma heresia, eu queria a hóstia! Na hora de recebê-la, o padre olhou bem dentro dos meus olhos. Deve ter pensado: “Quem é essa tatuada que eu nunca vi por aqui?” Mas se pensou isso mesmo, não teve o menor efeito, porque senti um amor muito grande vindo dele. E voltei para o meu banco em êxtase, me ajoelhei e deixei o pranto rolar. Entreguei todas as minhas questões mal resolvidas naquela prece molhada. Ao fundo, ouvia uma música linda que dizia que Jesus estará com a gente sempre que sofrermos, mas que mesmo assim o que ele quer é um sorriso no nosso rosto.

Então me recompus e sorri. Minha alma sorria! Estava leve e agradecida por ter recebido tantas bençãos naquele guichê. O mais engraçado é que achei a missa muito parecida com as sessões espíritas de que participo. No Movimento de Amor ao Próximo (MAP), as pessoas chegam em desequilíbrio (como eu estava me sentindo), cantam músicas e ouvem palavras edificantes, desaguam suas emoções e saem de lá fortalecidas para encarar as dificuldades da vida.

Não tive dúvidas de que Chico estava certo... Diferentes guichês conduzindo a um mesmo lugar... Espero que um dia exista um guichê único. Quando os homens não precisarão se dividir em diferentes religiões, criando tanta animosidade. Peço a Deus que este dia chegue logo... Amém.

15 comentários:

MISS TALBET disse...

Lindo e super na mira. Amei!

Tati Maia Lins disse...

Nossa, eu já tive "ataques" de vontade de ir à missa como este algumas vezes. E em todas foi uma choradeira só na Casa do Pai.
Eu nunca vou à missa. Nem a minha religião eu consigo definir direito qual é (tenho mágoa do Catolicismo). Mas me alimento de Deus nas fontes da vida e na natureza. E às vezes preciso ir a um guichê. :-) BEIJO!

sidney ferreira disse...

O gostoso de ler seu texto, é saber que tudo ali descrito vem com atestado e carimbo da SMS (Secretaria Mundial da Sinceridade).
Quem te conhece, reconhece ali, a sua alma inteira e verdadeira.
Como sempre uma obra belissima.
beijos

Fernando Freire Jr. disse...

Pois é. Eu tb fui criado católico (embora tenha fugido da primeira comunhão) mas aos 14 saí do corpo e o mundo espírita se abriu. Desde então nunca mais entrei numa igreja que não fosse para um casamento ou batizado. Mas de janeiro pra cá tenho entrado em igrejas (vazias) frequentemente por causa de minha namorada católica-espírita (que vai a missa mas lê o livro dos espíritos antes de dormir). E quer saber? Outro dia tive vontade de dar uma chance ao lugar e esquecer um pouco a birra com a instituição e o papa. Olhar para o templo e ver apenas um lugar de comunhão. Assim que eu for, eu te conto!
Beijos mils!

JPassaro disse...

Puxa, Ana... Muito legal que aconteceu essa coisa bela e linda contigo, junto de tua mãe - no local que ela tanto gosta de estar.
Gostei muito quando você descreve a, digamos, "chatice" dos ritos católicos dentro da igreja. É muito estranho e cansativo para aqueles que não estão devidamente entrosados com aquele processo. Eu também sempre me senti assim - e ainda hoje também.
Gosto de entrar em igrejas mais para ver a arquitetura do quê para outra coisa. Mas, ainda assim, troco uma palavra com Deus.
Gostei muito deste teu texto, acho que foi um dos melhores que você já fez. Ele se encaixa dentro de algo místico que temos.

Marcio Bruno disse...

Imagine não existir países
Não é difícil de fazê-lo
Nada pelo que lutar ou morrer
E nenhuma religião também
Imagine todas as pessoas
Vivendo a vida em paz


Talvez você diga que
eu sou um sonhador
Mas não sou o único
Desejo que um dia
você se junte a nós
E o mundo, então, será como um só

Unknown disse...

Querida Ana, adorei o seu texto e também a sua reflexão! Ano passado estive em um evento ecumênico, realizado em uma sinagoga da Zona Sul, e tive a felicidade de ver 7 religiões celebrando juntas. Foi um dos momentos mais bonitos da minha vida! Guichês, uni-vos! :))) Beijos da vizinha de guichê, Fernanda

ira disse...

Aninha, este foi o texto mais completo e verdadeiro que já li. Você se superou com tanta sinceridade, e eu, me identifiquei do começo ao fim. Fantástico!!!!
Excelente para reflexão, muito nutritivo. E eu estava querendo de mais saber como havia sido o seu dia das mães e obtive a resposta.
PARABÉNS, cada vez mais quero aproximar-me de VC! parabéns também aos seus amigos comentaristas, parece-me que já os conheço pois acompanho todos os depoimentos como lendo velhos amigos!
Quanto à missa, frequento mais a de 7º DIA, mas o que me impressiona é que parece que os padres sofrem de TOC transtorno obsessivo compulsivo, quando começam a passar o pano na taça , olhando inúmeras vezes para dentro da mesma, e parecendo que nunca fica bom o suficiente rsrsrsrs

Cláudia Lima disse...

AMEEEEEEEEEEEEEEEEEEEIIIIIIII!

adriana bragança disse...

QUE BOM QUE VC SENTIU A PRESENÇA DE DEUS E QUE VIU QUE MISSA Ñ É A MESMA DE 22 ANOS ATRÁS. BJSSS

Anacrys disse...

Nossa, voltei aos meus 8 anos de idade. Quase todos os domingos eu estava na sua casa e TB ERA OBRIGADA A IR À MISSA!!! rs...rs... e tb não entendia uma palavra daquele padre...rs.
E agora, de novo, vc "me fez" buscar Deus lá no MAP.

Amei! Como sempre!
Um bjo e uma prece.

Ana Lúcia Prôa disse...

Cris, e vc acha que, ao escrever esse post, eu não me lembrei de vc lá na missa comigo?????? Era um suplício, né? A gente - duas crianças! - ficava querendo bater papo, brincar, e toda hora meus pais mandavam a gente ficar quieta, kkkkkkk!

Ainda bem que tudo mudou...

Beijos, prima!!!

Ananda disse...

Nossa adoreii..rsrs(olha q nem gosto mto de ler..mas li ate o final..rs).Me identifiquei mto...acho que a maioria passa por isso,ou ja passou.

bjsss

Taís Prôa disse...

Tia, sabe que as vezes me dá a maior vontade de ir a missa!!!
Só que eu gostava mt da missa lá de Friburgo, ai fica dificil achar uma igual!!!
Era bem animada assim desse jeito que vc contou aki!!!
Bjão

Erica Gaião disse...

Oi Ana! Estou passeando pelo seu blog e estou amando. Parabéns! Está muito bacana.

Tenho certeza que muita gente passou por essa experiência do "guiche diferente" em algum momento. Para falar a verdade eu estou experimentando o catolicismo novamente, participando das missas aos domingos, na companhia da minha Ana, e estou adorando. Me faz muito bem e a sensação é exatamente essa que você descreveu. Na verdade, o que nos impede é justamente a imposição e a falta de conhecimento. No momento que estamos disponíveis e dispostos a caminhar com os nossos pés e conhecer o desconhecido, tudo muda...

Parabéns e muito sucesso.

Bjks,

Erica