sexta-feira, 19 de março de 2010

20 anos depois



Não... Ela não podia acreditar... Aquele homem alto, um pouco mudado pelo tempo mas ainda tão bonito, era ele mesmo? Estava fazendo o check-in quando o viu cruzar o saguão do luxuoso hotel. O olhou tão fixamente, mas tão fixamente, que esta vibração deve ter surtido algum efeito. De repente, ele virou o rosto na direção dela. E seus olhares se cruzaram. Os vinte anos de distância que separavam a última vez que se encontraram se reduziram a nada. Ele sorriu. Ela sorriu.
Caminharam na direção um do outro. “Nossa, quanto tempo?”, falaram ao mesmo instante. E riram. “Você também está hospedado aqui?” Claro que sim! Ela nem precisava perguntar isso, mas cadê o assunto? Ambos estavam naquela cidade fria a trabalho. Tinham um tempinho antes de seus compromissos. Foram tomar um drinque, por que não?
A última noite que haviam passado juntos tinha sido mágica. Eles nunca se amaram como os românticos acreditam ser o amor. Mas sempre sentiram uma atração incontrolável. Como explicar isso? Pra que explicar... A aspereza dos lençóis dos hotéis baratos que frequentavam na juventude compreendia tudo! Até o momento em que a vida de cada um tomou seu rumo e seus corpos se perderam.
Os poucos minutos no bar do hotel afastaram qualquer hiato que aqueles anos impuseram. Falaram de suas carreiras vitoriosas, de suas famílias, de seus filhos... Estavam tão confortáveis conversando, mas o relógio, esse estraga-prazeres, os chamou à razão. Combinaram de se encontrar naquele mesmo lugar às 8.
Os ponteiros se arrastaram... Por que a noite estava demorando tanto pra chegar? Nas reuniões chatas, a cabeça de um estava no pensamento do outro.
Finalmente, a hora. Cara a cara, corpos bem pertinho, se entregaram aos vapores etílicos. Naquele momento, não havia mais família, não havia mais cônjuge, não havia mais juízo. Não se sentiam traindo ninguém. Nos últimos 20 anos, outras pessoas é que tomaram seus lugares. Um era do outro, de alguma maneira. Então, natural que subissem para a suíte e se amassem como se jovens ainda fossem. Agora sobre macios lençóis de cetim.
Toda a cumplicidade estava de volta. Todo o prazer. O maior prazer de todos. Não se importavam com as mudanças em seus corpos. O amadurecimento os havia deixado ainda mais interessantes. Uma noite inteira de entrega. Uma grande saudade preenchida.
       Quando os primeiros raios de sol ousaram invadir o quarto, eles tiveram medo. Sabiam que estavam prestes a deixar aquele vazio da saudade se formar novamente.
Não tinha jeito... O trabalho de cada um naquela cidade fria – que eles tanto aqueceram – havia chegado ao fim. Se despediram no saguão sem um abraço sequer. Apenas um dissimulado aperto de mãos, acompanhado por olhares cúmplices. Não trocaram telefones. Que o destino se encarregasse de os reaproximar. 
          No íntimo, torciam para que isso não levasse mais 20 anos...

16 comentários:

Mila Mittos disse...

ADOREI...+ eles tinham que trocar telefones!
Beijos ♥ ♥ ♥

Fox disse...

Oi.... como sempre perfeito!! Quando leio seus textos consigo visualisar todo o cenário, as pessoas com rostos definidos, os sentimentos etc...

Roger Gorini disse...

Por que vc tem sempre que ser esse multiprocessador emocional? Qual de nós não teve sensações parecidas, senão iguais às descritas? Expôr fraquezas e sentimentos sem medo, sem receios... ah, Prôa... ah, Prôa.....

Fuji disse...

era só pegar o msn.rs mas pelo menos se esbaldaram, ne hahahah

bj. te cuida.

JPassaro disse...

Ler Borges me fez acreditar que temos diversas opções, diversos caminhos, mas sempre optamos por um, negando todas as outras possibilidades. Desta maneira, conforme compreendi Borges, estamos sempre decidindo caminhos sem saber o que, de fato, vai acontecer. A vida é um labirinto - um caminho de erros, acertos, confusões, encruzilhadas, sem referências. Somos, será?, um acaso?
Eu, por breves momentos, tenho um receio esperançoso que tais coisas (como a de querer novamente viver algo com alguém especial do meu passado) podem vir a acontecer no futuro - não apenas comigo mas com aquela que estarei. O que é sentir isto? É uma deslealdade, uma maneira de trair por meio de uma esperança, de uma vontade de sentir de novo, um ressentimento?
Penso, baseando-me no que interpreto de Borges neste caso, que somos uma soma de decisões que tomamos por toda nossa vida. Eu poderia ser inconsequente e sugerir que a soma dos fatores (decisões) não altera o produto (a vida). Mas não... Acredito que devemos ser sempre justos não apenas com nossas vontades, mas principalmente com aqueles que estão conosco no presente. Piegas, careta, certamente, mas estes foram mais fatores que me tornaram assim.

Aliás, o teu post me lembrou muito 2 filmes que adoro: "Antes do amanhecer" e "Anter do entardecer". Se nunca viu, pegue-os para ver - e, claro, veja na ordem correta hehe Amanhecer 1º e Entardecer depois.

PS: Obrigado pelos comentários. Curti ;)

ira disse...

Bilhetes ao amante:
"sempre que vejo vc esqueço de desviar o olhar e...
Te coloco olho gordo, de tanto te desejar"
Te amo antes, durante... e te ADORO depois! Estes escritos a 30 anos!
Se encontrasse minha antiga paixão, tenho a forte sensação que não rolaria nem um "OI"
Um encontro deste é muito carnal para o meu espírito!
Ana o Roger tem toda razão: VC é um MULTIPROCESSADOR EMOCIONAL
Beijinhos e parabéns.

patdantas disse...

Sorte deles terem (re)vivido emoções por tanto tempo guardadas.
bjo

Anônimo disse...

Todo dia me encontro com meu amor de 20 anos, acho que sou um felizardo. E cada dia fica melhor.

Bjs Aninha

Marcio Bruno disse...

Todo dia me encontro com meu amor de 20 anos, acho que sou um felizardo. E cada dia fica melhor.

Bjs Aninha

P.S. Não sou anonimo, por isso postei de novo. :-)

Fernando Freire Jr. disse...

Faz exatos 17 minutos que deixei minha namorada na rodoviária onde pegou o ônibus para a serra. Cheguei aqui, corri pra ler seu texto e dei de cara com uma despedida de olhares cúmplices e esperança de que o reencontro não demore. Foi exatamente o que vivi e senti 17 minutos atrás. Seu texto me fez chorar, mas de felicidade. Porque tenho alguém, alguém tem a mim e certamente estaremos juntos em no máximo 10 dias. Você sempre me surpreende. Nunca sei que emoção você vai despertar em mim com seus textos. Hoje só posso agradecer por fazer minha semana começar tão bem. Um beijo, com muito carinho.

Cláudia Lima disse...

Quem não quer um reencontro desses???
Bjs

Glória Britho disse...

Ai, ai..
Como eu gostaria de viver um reencontro desses. Os que me aconteceram cheiravam a café requentado, mofo, pneus teimosos em volta da cintura e rugas indiscretas. Na próxima quero nascer pisciana snif,snif.

By the way: A Vigilância Sanitária apareceu ontem. Deu uma m.. danada.

Unknown disse...

Que delícia!
Adorei.
Vc consegue ligar o sistema de turbilhonamento do corpo ...rs... é.. que nem máquina de lavar..rs.
Agora, não trocar nem um emailzinho? Um orkut? Ahhh, isso não se faz...rs.
Mas certamente o destino se encarregará disso.
um bjo.
Cris.

Unknown disse...

Adorei!!!
Ficou um gostinho de quero ++++ né?!!!
Beijos Cunhada vc é D+!!!!

georgia cabecos disse...

Adorei! Tocou fundo, como sempre!
Faço das palavras do meu mano Roger as minhas....
Bjs

. disse...

Amei! Até me levou a pensar o que aconteceria se eu reencontrasse um certo ex. Muito legal, pois de vez em quando penso a respeito dessas situações.