segunda-feira, 21 de junho de 2010

Não existe Super-Homem... Por Rodrigo M. Ferreira

Era uma noite simples, como tantas outras pelas quais enveredei após sair com meus amigos. Beiravam as cinco horas da manhã, e lá estava eu, subindo pelo que pareceu a milésima vez aquela avenida deserta para poder pegar meu ônibus e chegar à santa paz do meu lar.

Sim, o que muitos podem achar é que sou louco. Talvez eu seja mesmo, mas peço que cada um interprete da forma que achar melhor e que não me julgue pelos meus erros passados.

Após sair de uma boate onde comemorei o aniversário de um grande amigo, caminhei com outro amigo em direção aos nossos respectivos pontos de ônibus. Entretanto, ao seguirmos pela avenida onde os ônibus passavam antes de chegarem ao ponto final, o ônibus que meu amigo deveria pegar pra ir pra casa passou. Começamos uma pequena discussão sobre ele ter que pegar aquele ônibus e eu ir sozinho até o ponto final. Claro que eu, Super-Homem da meia-noite, insistia que, se ele não pegasse o ônibus, sabe-se lá que horas ele poderia pegar outro, enquanto o meu passava a toda hora e sempre tinha um no ponto final. Relutante, ele assentiu, claro. Sendo assim, lá estava eu, depois que meu amigo pegou o ônibus, caminhando sozinho pela avenida que, àquela hora, só tinha uns poucos festeiros esperando pra ir dormir em casa.

Foi então que aconteceu. Dois vultos magros e altos saíram das sombras e vieram em minha direção por trás. Não sei se foi o medo, mas fiquei tão imóvel quanto um carvalho centenário numa tempestade. Quando me abordaram, nenhuma palavra foi dita. O primeiro me segurou pelo pescoço, numa espécie de mata-leão meio frouxo que não visava me sufocar, mas me imobilizar, para que o segundo atingisse seu objetivo: cravar uma faca na parte interna da minha coxa direita e evitar qualquer reação que eu pudesse ter contra eles. Afinal eu, jovem alto beirando 1,90 m de altura, forte e quase sóbrio seria um problema pra eles se estivessem desarmados. Acho que eles não quiseram a dúvida e, por isso, usaram a garantia de me apunhalar com uma faca. Após a punhalada, um deles pronunciou as palavras que ficaram gravadas a ferro quente na minha memória:

– Perdeu, e isso é só o começo...

O segundo se adiantou e disse:

– Passa telefone e dinheiro.

No meu desespero, fiz o que devia fazer: enfiei a mão nos bolsos, tirei o que tinha lá (meu celular, meu molho de chaves e 10 reais que tinha sobrado de troco da boate) e disse que era tudo o que eu tinha. O segundo tirou a faca pra pegar meu telefone e o dinheiro, pouco antes do primeiro me soltar e meu peso cair todo sobre a perna lesionada. Foi então que ela veio. A Dor, lancinante e impiedosa, me atingiu com toda a sua ira. Não havia mais medo, nem desespero, só a Dor que me pegou de surpresa e levou todo o resto embora, inclusive os dois vultos encapuzados que a trouxeram. E minha voz, com um berro, se esvaiu da minha garganta.

Lá estava eu. Sozinho naquela avenida. Nem mesmo os boêmios esperando seus ônibus estavam mais nos pontos. Nem um carro passava. Nem um rato grunhia no esgoto abaixo dos meus pés. Sozinho. Nunca tive medo de ficar sozinho. Era o que eu menos queria naquele momento.

De repente, a Dor sumiu. O que veio no lugar foi a minha maior qualidade: a razão. Pensei no meu estado e olhei o corte, a faca entrou uns 8 cm na minha coxa, mas não parecia ter atingido nenhum nervo, eu conseguia andar. Foi o que eu fiz, andei até a esquina da avenida, onde achei um telefone público, um orelhão. Tirei o fone do gancho, mas percebi uma coisa: levaram meu celular, e com ele todos os números que eu nunca decorava. Fugindo do desespero, usei minha racionalidade e liguei pra emergência dos bombeiros. Infelizmente, como eu esperava, ninguém me atendeu. Liguei para o Samu. A atendente, com voz de revoltada, disse que demoraria de 15 a 20 minutos. Até lá meu sangue já estaria todo no chão.

Voltei a pensar. Lembrei o número de um celular, o do meu melhor amigo, pra quem eu ligava a cobrar sempre, por isso sabia o número de cabeça. Ele me disse que estava em casa, eu falei meu estado e perguntei onde ficava o hospital mais próximo. Ele me disse, mas era um pouco longe pra ir a pé com a coxa esburacada. Ele me mandou seguir para o batalhão de polícia, que era onde eu ia pegar meu ônibus, porque era mais perto e lá eles poderiam me ajudar. Foi o que eu fiz. Caminhei um quarteirão até chegar lá e um policial militar estava na porta, fazendo guarda. Ele me colocou pra dentro do batalhão e ligou pra emergência mas, assim como eu, não obteve sucesso. Decidido a me ajudar, ligou pra central e pediu uma viatura da PM pra me levar ao hospital. Dois minutos depois lá estava eu, sentado no banco de trás de uma viatura da PM indo pro hospital.

Já no hospital, fiquei entre os acidentados terminais da emergência esperando atendimento. O que eu vi me preocupou mais do que minha coxa. Mas não é sobre isso que vim escrever. Depois de esperar uns minutos que pareceram uma eternidade na emergência, me levaram para a sala de sutura, onde fui gentilmente costurado pelo assistente da cirurgiã vascular de plantão. Meu amigo aniversariante foi me encontrar lá, sua expressão beirando o desespero. Me trouxe pra casa, de táxi, e explicou pra minha família o que eu expliquei pra ele no caminho.

E hoje estou aqui, em casa há uma semana, escrevendo esse relato verídico sobre a incapacidade do cidadão. O cidadão que é capaz na hora de pagar seus impostos, mas não pode andar sozinho na rua. Aquele cidadão que respeita as leis, mas não poder esperar um pingo de segurança nas ruas. Sem falar naquele cidadão que ouve promessas milagrosas de políticos e é capaz de votar, enquanto não pode contar com uma simples ambulância quando precisa.

Também escrevo porque espero que esse relato ajude a pôr juízo na cabeça daqueles que pensam que são Super-Homens, como eu pensava que era. Não pensem que é demagogia de minha parte, mas, sinceramente, não desejo pra ninguém o que eu passei, e sei que eu poderia ter evitado se pusesse acima da circunstância a prudência.

14 comentários:

Ana Lúcia Prôa disse...

Quero ser a primeira a comentar... Esse texto foi escrito pelo meu sobrinho Rodrigo, que sofreu uma violência e soube transformar a Dor (muito bem colocada por ele em letra maiúscula) em arte e alerta. Que todos possam ler esse texto com atenção... e admiração.

Parabéns, Rodrigo, por suas palavras e pelo seu exemplo! (Embora eu lamente que isso tenha acontecido...)

Beijos,

Ana Prôa

Taís Prôa disse...

Nossa, coitado do meu irmão!!! Ele me contou o que tinha acontecido, mas lendo aqui temos a verdadeira dimensão do que foi!!!
Que absurdo você está nessa situação e não conseguir sequer uma ajuda do que espera ser eficiente. Depois dizem que qualquer emergência é só ligar pro SAMU!! Mentira braba, muitas vezes eles nem devem acreditar no que estamos falando!!
Bom ele ter escrito isso aqui no seu Blog tia, pra que as pessoas possam ver como estamos bem servidos, pra não dizer o contrário!!

Glória Britho disse...

Que horror, Ana! Estamos mesmo reféns nessa cidade. A parte boa é saber que o Rodrigo está bem e que ele é sim, um Super-Homem, por tanto discernimento quando foi necessário. A parte de se arriscar numa rua escura, não é complexo de Super Herói não, é a inocência de achar que pode ser amparado por um Estado podre. Mas as eleições estão ai. Vamos fazer a nossa parte?

Millah disse...

Pow coitado do Rodrigooh... + ele tem razão! TEM Q TER UM ROBÔ GIGANTE PRA MATAR TODOS OS TRAFICANTES E BANDIDOS!
UHUL ROBÔ LEGAL
Bjs rodrigooh

Ana Lúcia Prôa disse...

Filhinha amada, se me permite um aparte, robô gigante que mata os bandidos é coisa ultrapassada, da década de 1960, nos filmes do National Kid e cia. O segredo para um mundo melhor é vencer toda essa violência com educação, com vontade, com votos acertados nas eleições (como bem disse a Gloria), com um sistema prisional que muda as pessoas pra melhor (e não as transforma mais ainda em monstros)... Enfim, violência só gera mais violência... E se esse robô realmente existisse, será que não mataria também uma porção de inocentes? Ou pessoas que têm capacidade de mudar e ser do bem?

Eu acredito na mudança das pessoas. Eu acredito num mundo melhor. Eu sou brasileira, rsrs...

Alessandra Miranda disse...

Estou aqui para agradecer , a DEUS em primeiro lugar a meu filho por ser esse menino de juizo que sempre foi e por isso não se transformar em uma tragédia!(Pois poderia ter sido bem pior!).
Quando recebi a noticia ,parecia que tinha ficado sem chão, essa semana ainda estou meia que áeria!
Tem mais ou menos uns 5 anos que minha filha ficou internada devido uma Coreia(nem sabia que essa doença existia)em uma noite no hospital conversando com uma ´senhora que era evangelica ela me disse:"AS VEZES É PRECISSO QUE DEUS TE DE UM PEQUENO TOQUE , QUE É PRA VC NÃO ESQUECER QUE ELE TA ALI DO TEU LADO! NÃO QUE VC NÃO ACRETIDE NELE, MAS AS VEZES É TANTA COISA NA NOSSA VIDA, NO NOSSO DIA-A-DIA QUE A GENTE ACABA ESQUECENTO DE AGRADECER!"
Desde desse dia, todos os dia a toda a hora da minha vida, se é coisa boa ou coisa ruim, eu estou agradecendo!Obrigado senhor, poe esses filhos maravilhosos que colocaste em meu caminho, por esse maridão que eu amo muito e para eeternidade e por essa familia maravilhosa que tenho!
Filho que vc se recupere logo, mãe te ama muito( já parei de chorar)
OBS: Desculpa Ana por esse desabafo e obrigada por ta divulgando esse texto do meu filho e que sirva de alerta. Obrigado tmb ao apoio que ele teve dos policiais e dos medicos no hospital!
Só lamento pelo atentimento da ambulância e do corpo de bombeiro!

Alessandra Miramda(mãe do Rodrigo)

Rodrigo M. Ferreira disse...

Obrigado a todos vocês, pelo carinho e a atenção dados as minhas palavras. Que o pouco que eu escrevi sirva pra iuluminar a mente de alguém, qualquer um, para que seja evitada uma situação parecida com qualquer conhecido, amigo ou parente. Novamente obrigado a todos pelo carinho, e saber que alguém leu, já faz eu me sentir muito melhor.

Leandro disse...

Para mim essa estória é um fato. Eu sou testemunha. Sou o amigo, que caminhara com ele em direção aos nossos respectivos pontos. De certa forma, sinto-me meio responsável, pois deveria ter insistido mais com ele, ou até mesmo brigado com ele para que fôssemos juntos para casa no mesmo ônibus. Mas assim como todos que o adoram, agradeço a Deus por tê-lo protegido.

Anônimo disse...

É no que dá passar 500 anos com gente style PSDB no poder. Sorte sua q não comeram sua bunda e tacaram fogo no q sobrou.

camilla disse...

eh meu amigo, e depois me deixa preocupadissima com vc. o pior e n poder ir a sua casa pelo metivo q vc escreveu no texto q é segurança.
vc estava na hora errada no lugar errado, infelizmente essas coisas acontecem.
ainda estou um pouco preocupada, mas n igual ao dia q eu soube da noticia.
espero q vc esteje super bem, sabe q gosto mto de vc e essa preocupação e de alguem q t admira mto
bjo

Nathália Miranda disse...

Foi um choque quando recebi a noticia, antes mesmo da minha mãe me falar se ele estava bem ou não a minha pergunta foi: Como está meu irmão? Quando a minha mãe me disse como ele estava, agradeci a Deus, por ter protegido meu irmão.. por não ter acontecido algo pior. Fiquei em choque quando recebi a noticia, não chorei na frente dos meus pais, mas sim sozinha. Mas graço a Deus está tudo bem com ele e ele esta se recuperando devagarinho. Meu irmão pra mim sempre vai ter essa imagem de Super-Homem o Super-Protetor. Que isso não se repita nunca mais, e que você Digo, que Papai do Céu lhe abençoe e lhe proteja sempre, te amo mt cabeça. beijos!

Marcia Patsserie disse...

Como adoro essa familia e é claro, o Rodrigo.Por ser amiga de sua mae e seus tios lamento muito pelo acontecimento por varios motivos muito bem citados pelo Rodrigo.Mas so queria dizer que ele pensa que estava so,desde o primeiro momento Deus estava presente ao seu lado nao deixando que nadade pior acontecesse e o guiou da Rua onde estava ate seu destino final que foi sua casa acompanhado de seu amigo.As vezes nao entendemos por que passamos por certas cituações,mas tenho certeza que depois de passado o susto esse lamentavel acontecimento sera de uma grande lição de vida para o Rodrigo,sua familia,seus amigos e para quem mais ele relatar esse acontecimento.Rodrigo tenha certeza que vc nunca estara sozinho.Te adoro bjs

Marcia Anunciação

Parabens Ana pelo seu blog

Anônimo disse...

Ai Digo ainda bem que vc tá bem!! Cara qndo eu soube, não consegui reagir, só fiquei pensando se vc taria bem! Agradeço a Deus por não ter sido tao grave assim!Sei qe vc não teve intenção nenhuma, mas agora talvez vc aprenda a ser mais sensato! Mas não qro ficar aqui brigando ctg, não é só vc qe teve culpa, todos nos temos um pouquinho de culpa pelo oq está acontecendo não só no rio, no Brasil inteiro, o pior qe já estamos chegando nas eleições e como saber ql pessoa é a melhor, não temos melhores, sinceramente nem temos ah qm votar, é tão ruim isso, poxa tenho 20 anos e to meio sem esperanças, por mais q talvez alguem consiga mudar alguma coisa!
Mas como minha família diz, por menos esperança q temos, devemos nunca deixa-la morre!

É isso, agradeço a Deus pela sua vida! Espero qe iso um dia mude,por menas esperança qe tenho, te amo muito meu amigo!

Beijos. Giselle

Unknown disse...

E aí meu amigo, melhor agora? Que situação, heim? O pior de tudo é que não temos em quem confiar o nosso voto. Nenhum desses candidatos merece ser chamado de "representante do povo". Graças a Deus que vc está inteiro e as sequelas não serão graves.Ainda assim, fica uma profunda insegurança em cada um de nós,não importando a idade nem o sexo. O que eu sei é que existe um
Criador, e é somente nEle que devemos confiar.Não podemos deixar de viver,nem de prosseguir em direção ao nosso objetivo.Siga em frente, pois vc tem um futuro brilhante.Saiba que vc pode contar com aqueles que são seus verdadeiros amigos.Estamos juntos nessa luta e parabéns pelo texto que foi muito bem escrito. Abraços.