O aro dourado em seu anelar era o símbolo da esperança. Olhava-o sempre com a certeza do retorno daquele a quem amava. Ou a quem se acostumara.
Não demorou muito para vê-lo desfilando com uma outra. Tipinho interessante, tão diferente dela. Tão cheia de vida! E ela ali... Como vela apagada com cera seca escorrida.
Ainda assim, não tirou a aliança. Fazia parte de seu corpo. Retirá-la seria tão violento quanto uma amputação. Não se sabia mais onde acabava a aliança e onde começava a pele. Era tudo uma coisa só.
Numa manhã, abriu os olhos e a primeira coisa que viu, pousada sobre seu travesseiro, foi a aliança-dedo. Esticou ainda mais o olhar e viu o travesseiro dele vazio. Por que ainda teimava em colocá-lo na cama? Sentiu náuseas. Levantou-se e o enjôo só fez piorar. Pensou em tomar um remédio, mas, a cada vez que olhava para sua mão esquerda, seu mal-estar se acentuava. Não era caso de remédio...
Foi aí que a coragem lhe subiu à cabeça, pegando um atalho pelo lado direito do peito, para não esbarrar no coração. Havia chegado a hora. Com os dedos da outra mão, começou a puxar aquele elo que não a ligava a mais ninguém. O elo insistia em ficar. Mas ela estava resoluta. Nada que um pouco de água e sabão não resolvessem. E foi com alívio que se deu a extirpação. O enjôo passou.
Mas nem deu tempo de comemorar a vitória sobre seus sentimentos. Seus olhos se arregalaram de pavor ao ver que, em lugar da aliança, restou em seu dedo um sulco. Profundo. Quase tão profundo quanto o sulco deixado por ele em seu íntimo.
Esfregou, esfregou, esfregou. Massageou toda aquela cavidade circular deixada pela aliança, mas nada de desaparecer. Ela era impotente perante a força daqueles anos e anos passados com alguém. Impossíveis de se apagar.
Passaram-se dias, semanas, meses... Como tatuagem, lá permanecia a marca de sua aliança.
Cansada de olhar para o símbolo do que não existia mais, resolveu colocar uma prótese: um belo anel com uma tremenda ametista se fixou por sobre o sulco.
Não o tirava para dormir. Não o tirava para tomar banho. A aderência foi total, sem rejeição da pele.
Começou a se sentir leve. Sua chama voltou a se acender. Decidiu se amar.
Um dia, resolveu arrancar a prótese. Não precisava mais dela. E que surpresa: a pele havia se regenerado. O sulco se preencheu de alegria de viver. As únicas marcas em seu corpo, agora, eram duas linhas de expressão no rosto que surgiam a toda hora, a cada novo sorriso.